Borges e os golpes da vida
(de que ele, pessoalmente, dizia nada saber)
Borges, que não via nada à frente, possuía uma boa visão noutras direcções: via atrás de si, de viés, lateralmente e apocrifamente. É sabido – pelo menos di-lo a lenda – que Borges leu tudo. Quando cegou, já só tinha um grande e estranho hipertexto a correr-lhe por dentro das pálpebras. Mas nós aqui, nestas lucubrações sobre o que a literatura pensa da vida, achamos que os textos não andam a correr sozinhos, perseguidos pelas vidas: em algum lugar e tempo passam rasteiras, dão piparotes ou simplesmente empurram os seus criadores, gente tão assustada, ou tão só melancólica, quanto todos nós. Ora, Borges gostava de falar de arruaças e canalhices textuais. Falemos nós também delas.